Irma Simona Brambilla será secretária-geral do Dicastério para a Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, responsável pelas ordens e congregações religiosas
Pela primeira vez em dois mil anos de história da Igreja Católica, o Papa Francisco nomeou na segunda-feira uma mulher, a irmã Simona Brambilla, para dirigir um “ministério” do Vaticano, anunciou a Santa Sé nesta terça-feira. Na véspera, o Pontífice também nomeou o cardeal Robert McElroy, pró-imigrantes e um crítico ferrenho de Donald Trump durante seu primeiro mandato, como próximo arcebispo da capital americana, Washington.
Brambilla, de 59 anos, de nacionalidade italiana, foi nomeada chefe do Dicastério para a Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, o “ministério” da Cúria (governo do Vaticano) responsável pelas ordens e congregações religiosas de homens e mulheres — incluindo mais de um quarto dos padres do mundo. A antiga superiora-geral das Irmãs Missionárias da Consolata, na Itália, já era a número dois deste dicastério desde outubro de 2023.
— Esta é uma notícia muito boa — disse Anne-Marie Pelletier, teóloga que escreveu um livro sobre as mulheres e a igreja. — É algo completamente novo. Para mim, é um momento realmente importante.
Segundo o Vatican News, o órgão de comunicação oficial do Vaticano, desde a eleição de Francisco, em 2013, e até 2023, a porcentagem de mulheres em cargos na Santa Sé e na administração do Estado do Vaticano subiu de 19,2% para 23,4%.
No Estado da Cidade do Vaticano, o Papa argentino já nomeou duas mulheres para altos cargos nos dez anos do seu pontificado: em 2016, Barbara Jatta, diretora dos Museus do Vaticano, e a irmã Raffaella Petrini, secretária-geral do Governatorato (entidade que administra a cidade) em 2022, cargo normalmente atribuído a um bispo.
E também pela primeira vez, há dois anos, Francisco permitiu que as mulheres votassem em uma reunião de bispos que buscava mapear o futuro da Igreja. Embora o papel das mulheres na Igreja estivesse entre os tópicos mais discutidos naquela reunião, que terminou em outubro, a questão se as mulheres poderiam ser ordenadas diáconas permaneceu em aberto.
Uma nomeação de fachada?
Mas Francisco também nomeou o cardeal Angel Fernandez Artime colíder do dicastério. Não ficou claro como os dois dividiriam as responsabilidades, com algumas críticas apontando a nomeação do cardeal como uma diluição da liderança de Brambilla. A historiadora da Igreja e feminista Lucetta Scaraffia descreveu a nomeação da irmã como “uma fachada”.
— Seria uma ótima notícia que uma mulher fosse nomeada secretária-geral, se não fosse pelo fato de que ela foi ladeada por alguém. É como designar um guardião que pode controlá-la — lamentou.
O último sínodo, realizado no fim de 2024, sublinhou a falta de visibilidade das mulheres na Igreja e na sua governança. Embora “mulheres e homens tenham igual dignidade como membros do povo de Deus”, o documento final aprovado pelo Papa aponta que “as mulheres continuam a enfrentar obstáculos para obter um maior reconhecimento” do seu papel.
As associações particularmente ativas na Europa e na América do Norte lamentam a marginalização das mulheres por um sistema considerado patriarcal, apesar do seu papel central nas paróquias de todo o mundo. Segundo estatísticas do Vaticano, o número de mulheres em ordens religiosas totalizou 599.228 em 2022. Um grande contraste em comparação ao número de padres, cerca de 128.500 e 50 mil irmãos.
No final do sínodo, a questão da ordenação das mulheres foi colocada em suspenso, uma vez que os participantes constataram que ainda há muitas resistências, sobretudo numa franja conservadora da Igreja e em certas regiões.
Brambilla nasceu em Monza, perto de Milão. Ela era enfermeira profissional antes de se tornar uma missionária da Consolata e tem doutorado em Psicologia. Ela liderou sua ordem religiosa como superiora de 2011 a 2023. (Com AFP e New York Times).
Por O Globo com agências internacionais — Cidade do Vaticano, Santa Sé