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SP: número de famílias que vivem nas ruas quase dobra durante pandemia

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Em 2021, segundo a gestão Ricardo Nunes (MDB), havia 31.884 pessoas sem-teto na cidade, sendo que cerca de 8.927 afirmaram viver com ao menos um familiar. Em 2019, eram 4.868.

Os dados foram obtidos pela Folha com exclusividade e fazem parte do censo da população de rua encomendado pela prefeitura. O levantamento, feito entre outubro e dezembro de 2021, mostrou que 28,6% dos entrevistados afirmaram viver na rua em família, percentual maior do que os 20% registrados em 2019.

Marcelo Camargo/ABr

Ao todo, a população de moradores de rua na capital aumentou 31% em relação ao censo anterior, de 2019, feito na pré-pandemia. Em relação a 2015, quando havia 15.905, o número dobrou.

A quantidade de pessoas que preferem ocupar só as ruas em vez dos abrigos também aumentou. Em 2019, 52% da população abordada pelos pesquisadores preferia as calçadas aos centros de acolhimento, em 2021, esse percentual subiu para 60%.

“A crise econômica se agravou, o desemprego disparou, a inflação subiu e, nesse período, a política pública da prefeitura para essa população continuou a mesma. Os centros de acolhida não são pensados para as demandas de quem vive na rua”, diz o padre Julio Lancellotti, da Pastoral do Povo de Rua.

Carlos Bezerra, secretário de Assistência e Desenvolvimento Social do município, reconhece a necessidade de reestruturação do sistema de acolhimento na cidade. Ele disse que a pasta pretende ampliar o número de centros para diversificar o perfil dos serviços e anunciou um programa que vai oferecer moradias temporárias para famílias em situação de rua.

“Quanto mais tempo a pessoa passa na rua, menores são as chances de conseguir recuperar a autonomia. Precisamos agir rápido para quebrar essa trajetória triste que começou na pandemia”, disse.

Fábio de Mello, 41, e Ângela Santos, 32 estão juntos há seis anos e foram despejados da casa onde moravam, na zona leste, no ano passado e passaram a viver na região central. Já são mais de dez meses na rua e nunca recorreram aos abrigos.

“A gente enfrenta frio, chuva, calor, medo de ser roubado ou agredido, mas não vai para abrigo. Não vamos nos separar para ir a um lugar em que somos ainda mais humilhados e corremos mais risco”, diz Mello.

Ele e a mulher vendem balas no semáforo e procuram bicos para se alimentar. “Ninguém dá emprego para quem não tem endereço. E, sem emprego, nunca vou conseguir uma casa. Entramos numa situação que não tem saída.”

Ainda de acordo com o censo, houve aumento de 230% do número de barracas de camping e de barracos de madeira instalados em vias públicas como moradias improvisadas. Em 2019, o censo encontrou 2.051 pontos desse tipo. Em 2021, foram localizados 6.778.

Segundo especialistas, moradias improvisadas são normalmente ocupadas por famílias ou pessoas que foram para as ruas recentemente e, por isso, buscam formas de manter a privacidade e aumentar a sensação de segurança.

“Desde o início da pandemia, a gente já observava não só um aumento da população de rua, mas também essa mudança de perfil. Já era possível identificar que grupos mais vulneráveis, como mulheres, famílias e idosos, tiveram que ir morar nas ruas”, diz Juliana Reimberg, pesquisadora do CEM (Centro de Estudos da Metrópole), da USP.

É o caso de Rosângela dos Santos, 40, que vive nas ruas do centro com o pai, de 60 anos, e o filho, de 12. “As pessoas humilham, mandam a gente ir trabalhar, parar de ser vagabundo. Mas quem dá uma oportunidade? Ninguém me chama para trabalhar”, diz.

Ela diz que às vezes é chamada para fazer faxina em lojas ou casas da região, que pagam de R$ 30 a R$ 50 pelo serviço. “Ajuda muito, mas é um dinheiro que acaba rápido.”

Reimberg afirma que, há anos, estudos nacionais e internacionais mostram que políticas eficientes para a população de rua não são aquelas que se concentram só em centros de acolhida, mas em ações para que as pessoas consigam deixar a situação, como acesso a emprego e moradia.

“A demanda dessa população não é por abrigo, mas por moradia. Sem um lugar para morar, elas não conseguem romper o ciclo, porque não encontram emprego. A política de abrigamento não é solução”, diz a pesquisadora.

O censo perguntou aos moradores de rua o que os ajudaria a deixar a situação. Dos entrevistados, 45,7% disseram que seria encontrar um emprego fixo, e 23,1%, ter uma moradia. Outros 8,1% declararam que seria voltar à casa de familiares, e 6,7% responderam que seria superar a dependência de álcool e drogas.

Conseguir um emprego é o sonho de Bruna Felix, 23, desde que chegou a São Paulo no início do ano passado. Ela saiu de Paranaíba, no Mato Grosso do Sul, com a esperança de que a capital paulista teria mais oportunidades de emprego, o que não aconteceu.

“Cheguei aqui e não encontrei nada. O dinheiro foi acabando e não tive escolha, acabei na rua”, conta.

Quem acompanha a situação dos moradores de rua na cidade afirma que o dado apontado pelo censo está subestimado, o que pode levar a elaboração de políticas públicas ineficazes.

A empresa Qualitest, contratada para fazer o censo, fez um relatório em que apontava uma série de dificuldades para abordar os sem-teto. O contrato custou R$ 1,7 milhão aos cofres municipais.

“Esse número é subestimado pela total inadequação com a qual foi feito esse censo. E a prefeitura foi alertada dos problemas metodológicos. Um número subestimado vai resultar, mais uma vez, em políticas públicas insuficientes e equivocadas, que não respondem quantitativamente nem qualitativamente às demandas da população de rua”, diz Lancellotti.

O secretário Bezerra rejeita as críticas ao censo e diz que a metodologia utilizada é a única forma para se chegar ao número e perfil da população de rua.

“Olhando apenas para os novos moradores de rua, são mais de 8.000, é mais do que toda a população de 70% dos municípios do interior paulista. Essa comparação nos mostra o tamanho do desafio que temos pela frente, o censo nos ajuda a desenhar políticas de forma célere, efetiva e com impacto”, afirma ele.

Desde o início da pandemia é visível o aumento da população de rua sobretudo na região central da cidade, onde há maior concentração de sem-teto pela facilidade de acesso a doações e equipamentos públicos. Em razão do crescimento, a prefeitura antecipou a realização do censo, antes feito a cada quatro anos.

Com informações do Folhapress

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