Estados tentaram conciliação, mas acordo foi rejeitado pelo Piauí; entenda
A disputa territorial entre o Ceará e o Piauí deve ter avanços importantes em 2024 com o resultado da perícia do Exército brasileiro prevista para o fim de junho. O estudo foi determinação da ministra do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, relatora do processo de litígio ajuizado na Corte em 2011.
Naquele ano, o então governador do Piauí, Wilson Martins (PSB), ajuizou Ação Cível Originária (ACO) na qual reivindicava quase 3 mil quilômetros do território cearense. O pedido é para que as localidades — que correspondem a parte do território de 13 cidades cearenses — sejam incorporadas a oito municípios piauienses.
Agora, o impasse será resolvido pelos ministros do Supremo. Contudo, ainda no início do processo, entre os anos de 2012 e 2013, houve uma tentativa de conciliação entre os dois estados, que acabou sendo rejeitada pelo Piauí.
O Diário do Nordeste narra como foram as negociações, que acabaram fracassando em 2013.
SUSPENSÃO TEMPORÁRIA DO PROCESSO
As tratativas para tentar o acordo envolveram o governo federal, por meio da Advocacia-Geral da União, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), além da Procuradoria Geral do Estado tanto do Ceará como do Piauí.
A proposta de conciliação foi feita, em fevereiro de 2012, pelo governo federal, sob o comando da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). O ministro Dias Toffoli, na época relator do processo, pediu a manifestação do Ceará e do Piauí sobre o assunto.
Em abril do mesmo ano, após os dois estados concordarem em participar da conciliação, Dias Toffoli suspendeu, temporariamente, o andamento do processo.
As tratativas foram feitas na Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal (CCAF), vinculada à Advocacia-Geral da União. As reuniões foram iniciadas em setembro de 2012, com quatro reuniões ocorrendo na CCAF e seis nos estados.
Ainda nos primeiros encontros, ficou definido que o IBGE iria desenvolver um projeto piloto para “identificação, reconhecimento e delimitação da divisa entre os estados do Ceará e Piauí”. Neste estudo inicial, o instituto fez a análise dos limites entre Poranga e Pedro II.
Poranga é a cidade cearense que pode perder mais território caso o Piauí saia vencedor no litígio. Cerca de 66,3% do território do município está na área em disputa. Neste caso, o maior beneficiado seria o município piauiense Pedro II.
Litígio Ceará x Piauí: maioria dos moradores é atendida por serviços públicos do CE, aponta estudo
RELATÓRIO TÉCNICO DO IBGE
Os estudos realizados pelo IBGE foram feitos entre os meses de fevereiro e junho de 2013. O projeto piloto cumpriu as seguintes etapas de trabalho:
- Pesquisa e Análise da documentação histórica disponível;
- Organização e elaboração da base de dados do Projeto, com as informações e insumos cartográficos utilizados para navegação e coleta de dados em tempo real com GPS;
- Georreferenciamento de pontos notáveis identificadores da divisa existentes na área; e
- Coleta em campo e inventário de dados sócio-econômicos e político-administrativos.
Em termo de reunião realizada no dia 9 de julho de 2013, assinado pela conciliadora responsável pelas tratativas entre Piauí e Ceará, Patrícia Batista Bertolo, é destacado que o estudo feito pelo IBGE está sendo realizado “em formato definido por todos os representantes”.
No mesmo documento, ela destaca que a metodologia utilizada pelo órgão é “pioneira” e que há interesse do IBGE “em utilizar essa nova metodologia para os demais litígios de divisas existentes no país”.
Uma das características do estudo foi a composição das equipes que foram a campo tanto para aplicar questionários à população — nos quais as pessoas eram indagadas sobre a divisa, a subordinação político administrativa do domicílio e a infraestrutura (água, energia, escolas) — como para realizar a localização e georreferenciamento dos marcos usados como para delimitar os limites — como hidrografia e elementos do relevo.
As equipes eram formadas por dois técnicos do IBGE — cada um pertencente à sede do órgão em um dos estados — e um técnico de órgãos estaduais do Ceará e um do Piauí.
“As perguntas (entrevistas) eram conduzidas pelos representantes técnicos dos Estados que acompanharam os técnicos do IBGE. Os marcos de pedra das divisas existentes (pedras e cercas, conforme testemunhos dos entrevistados) foram registrados, nas fotos, com a presença de cada representante técnico do Estado”, exemplifica a ata da reunião.
REJEIÇÃO DO PIAUÍ
O relatório técnico do IBGE foi apresentado em junho de 2013. No documento, o órgão sugere que uma divisa seja definida “em comum acordo entre os Estados”.
A divisa sugerida é definida a partir da “combinação de uma linha sinuosa da divisão das águas, utilizando-se da altimetria e hidrografia constantes das folhas topográficas, dados dos levantamentos fundiários do IDACE e os marcos de pedra encontrados na região”, explica o texto.
Na sugestão feita pelo relatório técnico, haveria poucas mudanças na atual divisa.
Confira a figura com a sugestão feita pelo IBGE para a nova divisa entre Poranga e Pedro II:
O IBGE aponta ainda que a metodologia usada no estudo se mostrou “eficiente” para a definição de divisas e recomenda que ela seja utilizada para a determinação dos limites no restante do território em litígio entre Ceará e Piauí.
No dia 20 de junho de 2013, a Procuradoria Geral do Estado do Piauí (PGE-PI) apresentou petição “solicitando o encerramento das tratativas”. Em reunião realizada em julho do mesmo ano, o Piauí reafirmou a intenção de encerrar a tentativa de conciliação.
Segundo ata de reunião do dia 10 de julho de 2013, o Piauí “aduzindo seu inconformismo com os resultados interpretativos da metodologia aplicada com base na argumentação ali tecida e, requerendo, ao final, o encerramento da conciliação”.
A conciliadora Patrícia Batista Bertolo informou ainda que ainda que “não recebeu durante as etapas de conciliação manifestação da PGE/PI questionando os trabalhos”.
“Considerada, portanto, a impossibilidade de avançar nos trabalhos, embora de interesse do Estado do Ceará, a Conciliadora declara encerrada as tratativas”, encerra a ata.
Na ata, não são transcritas as justificativas dadas pelo Piauí ao pedir o encerramento das tratativas de conciliação. O Diário do Nordeste entrou em contato com a Procuradoria Geral do Estado do Piauí para saber mais detalhes, mas a assessoria de imprensa informou que a PGE-PI não está se manifestando sobre o litígio entre Ceará e Piauí.
Por Luana Barros – Diário do Nordeste