De 51 instituições consultadas, 44 estimam que a taxa básica juros deve ser elevada a 6,25%.
Sem perspectiva de uma trégua na escalada dos preços no País no curto prazo, analistas do mercado financeiro acreditam que o Banco Central (BC) seguirá a política de aumento dos juros para controlar a inflação e levá-la para o centro da meta, de 3,5% em 2022. De 51 instituições financeiras e consultorias consultadas pelo Projeções Broadcast, 44 preveem um aumento de 1 ponto porcentual na taxa básica de juros, a Selic, em reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) na quarta-feira.
Com isso, o colegiado do BC, que se reúne a cada 45 dias para calibrar a Selic, elevaria a taxa para 6,25% ao ano.
Apenas sete instituições consultadas mantiveram as apostas em um ajuste mais duro da taxa básica de juros nessa reunião, o que foi cogitado pelo mercado após os dados mais recentes da inflação mostrarem um IPCA acumulado de 9,68% em 12 meses até agosto. Diversos economistas chegaram a apostar em uma “paulada” nos juros ainda mais forte que a alta de 1 ponto porcentual da última reunião do Copom, que elevou a Selic para 5,25% ao ano. Para se ter uma ideia da intensidade da medida, a última vez que o BC aumentou a taxa básica de juros em mais de 1 ponto porcentual de uma só vez foi em dezembro de 2002, nos últimos dias do governo Fernando Henrique Cardoso.
No entanto, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, realinhou as expectativas na semana passada ao garantir que o Copom vai manter “o plano de voo”, reforçando a sinalização de mais uma alta de 1 ponto. Ele prometeu que o Copom elevará a Selic o quanto for preciso para conter a inflação, mas esclareceu que o colegiado não irá reagir a cada novo dado divulgado.
“Passei a noite pensando sobre isso (a fala de Campos Neto) e voltamos para a nossa projeção para alta de 1 ponto na Selic”, diz o superintendente da Assessoria Econômica da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), Everton Pinheiro de Souza Gonçalves, que antes projetava uma alta de 1,25 ponto, para 6,50% ao ano.
Além da reunião desta semana, o Copom ainda terá mais dois encontros neste ano – em outubro e dezembro. Com a manutenção do ritmo atual de elevação da taxa, Gonçalves acredita que o BC continuará aumentando os juros no começo de 2022, até que a Selic chegue a 8,5% ao ano.
O economista diz que, para ser mais agressivo nos juros agora e trazer a inflação para o centro da meta de 3,5% no próximo ano, o BC teria que sacrificar ainda mais o crescimento da economia em 2022. Mesmo assim, a ABBC já revisou sua projeção de alta do Produto Interno Bruto (PIB) do próximo ano de 1,5% para apenas 1%. “Fazer política monetária não é fácil, tem muita sintonia fina, sobretudo em um ambiente com tantos riscos e incertezas. Em 2015 e 2016 a Selic foi mantida elevada por mais tempo e culminou em dois anos de recessão. É um dilema: se afrouxar um pouco a política monetária, pode dar problema na inflação, mas se o aperto for grande a atividade vai sofrer”, avalia. “Lembrando que o BC agora passou a ter como metas acessórias suavizar as flutuações da economia e fomentar o pleno emprego”, completa.
Analistas veem risco de estouro da meta em 2022
Diante das dificuldades de controlar a alta dos preços, parte do mercado financeiro já trabalha com o cenário de que o Banco Central vai descumprir em 2022, pelo segundo ano consecutivo, a tarefa de entregar a inflação dentro da meta. A informação foi apurada pelo Estadão/Broadcast com agentes de mercado, inclusive com alguns que tiveram assento no Copom.
Os entrevistados relataram que, além das estimativas oficiais para a inflação divulgadas para clientes, imprensa e o próprio BC via relatório Focus, analistas se debruçam sobre dados e fórmulas para obter números mais precisos. Se as previsões formais para o IPCA de 2022 rodam os 4%, as extraoficiais giram em torno de 5%.
A meta de para 2022 é de 3,5%, mas o BC tem folga para entregar uma taxa de até 5%, dentro do intervalo tolerado. Este ano, o teto da meta de inflação é de até 5,25%, mas a maioria das expectativas está em 8%.
Questionado sobre sua projeção de IPCA de 2022, um dos agentes respondeu com outra pergunta: “A oficial ou a que a gente está vendo?”. Essa prática está generalizada, conforme confirmou o Estadão/Broadcast com outros economistas.
Analistas ressalvam que, se persistirem as condições atuais nos próximos meses – o que acreditam que ocorrerá –, o cenário mais agudo de inflação se concretizará.
“O que temos hoje é uma inflação persistente, forte, caminhando para 5% em 2022”, resumiu um dos entrevistados, que já foi diretor do BC e não quis ser identificado. “Há pressões vindo de todas as partes”, afirmou outro. “O Focus e demais projeções públicas são fundamentais para criar um consenso. Mas é na hora de colocar o dinheiro que se vê qual é a informação mais certeira. Se bancos, corretoras e outras casas já estão usando esse material ferramenta de base, é ele que vale de verdade”, afirmou uma terceira fonte.
O economista-chefe do Banco Original, Marco Caruso, diz que, mesmo que a Selic chegue a 8% no fim do ciclo de aumentos, esse patamar já não é mais suficiente para garantir a inflação no centro da meta de 3,5% em 2022. “Acredito que o Copom vai, sim, acomodar alguma inflação acima do centro da meta, até porque elevar demais a Selic agora pode começar a fazer a inflação escorregar para baixo do centro da meta de 3,25% em 2023”, diz.
Estadão Conteúdo