Caso de sífilis de 10 mil anos atrás é descoberto no interior de MG

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A criança tinha quatro anos quando morreu, mas era tão pequena que poderia ser confundida com um bebê de um ano e meio.

Enterrada há quase dez milênios numa caverna no interior de Minas Gerais, ela trazia em seu esqueleto deformidades causadas, muito provavelmente, por um caso congênito de sífilis.

Trata-se do registro mais antigo da doença no continente americano, segundo o quinteto de pesquisadores da USP que analisou os ossos da pequena vítima. Eles acabam de publicar os resultados do exame dos restos mortais no periódico especializado International Journal of Osteoarchaeology.

A estimativa dos pesquisadores é que o sepultamento da criança no abrigo rochoso conhecido como Lapa do Santo tenha acontecido há pelo menos 9.500 anos, enquanto o caso de sífilis mais antigo detectado por trabalhos anteriores (num indivíduo adulto) tem 5.300 anos.

As pistas disponíveis atualmente indicam que a sífilis é a principal exceção no processo de trocas epidemiológicas entre as Américas e o Velho Mundo, que se iniciou a partir da chegada de Cristóvão Colombo ao Caribe em 1492. Em pouco tempo após o primeiro contato, doenças infecciosas trazidas por invasores europeus e africanos escravizados -em especial o sarampo, a varíola e a malária- dizimaram a população indígena, que não tinha defesas naturais contra tais moléstias.

Os primeiros surtos de sífilis na Europa, porém, também coincidem com a época das viagens de Colombo. Durante séculos, a doença, transmitida sexualmente e causada pela bactéria Treponema pallidum pallidum, teve efeito devastador sobre populações do Velho Mundo, causando lesões genitais e, mais tarde, em recaídas dos indivíduos infectados, na pele e no sistema nervoso, com efeitos como derrames e paralisia. Além disso, a doença pode ser transmitida pela mãe grávida ao feto.

Dados arqueológicos têm mostrado que tanto a sífilis quanto outras doenças causadas por bactérias do mesmo gênero, conhecidas coletivamente como treponematoses, já afetavam indígenas milhares de anos antes dos primeiros surtos europeus, registrados na virada do século 15 para o século 16. Por isso, a hipótese mais aceita hoje é que a sífilis teria sido levada pelas primeiras tripulações europeias para seu continente de origem.

“Já não há mais dúvidas sobre a presença muito antiga dessas doenças nas Américas”, pondera o bioantropólogo Rodrigo Elias de Oliveira, primeiro autor do estudo. “A questão é saber se ela surgiu no continente americano ou se a doença chegou até aqui junto com as levas iniciais de povoamento, por volta de 15 mil anos atrás. No caso dessa segunda possibilidade, ela poderia ter surgido na Ásia ou na própria África.”

Embora doenças aparentadas provavelmente também circulassem na população indígena pré-colombiana, não há evidências de que elas possam ser transmitidas de forma congênita. Esse fato, somado às lesões específicas no esqueleto da criança da Lapa do Santo, muitas das quais começaram ainda durante a gestação, indicam que a hipótese mais provável é que se trate de uma vítima da sífilis.

Os efeitos congênitos da doença podem ser detectados em diversas malformações no crânio, nos dentes e nos membros. Um dos mais visíveis é o chamado “nariz em sela”, o qual, como o nome sugere, tem uma aparência “afundada”. “A doença afeta as cartilagens que normalmente uniriam os ossos nasais aos da fronte, dando à parte de cima do nariz uma forma côncava”, explica Oliveira.

Além disso, a criança provavelmente tinha dificuldade para caminhar, a julgar por lesões em seu fêmur esquerdo. E, como os ossos de seu crânio se fundiram cedo demais, quando ainda era preciso mais espaço para o cérebro em desenvolvimento, esse processo deve ter aumentado a pressão dentro da estrutura craniana, o que aumentaria o risco de problemas como um AVC (derrame). Seria uma explicação para a morte precoce da vítima.

Segundo Oliveira, embora a sífilis congênita seja mais conhecida pelos casos oriundos de contágio sexual pela mãe da criança, uma transmissão por contato, por feridas na pele, também não pode ser descartada.

Também assinam a pesquisa o arqueólogo André Strauss, o antropólogo Rui Murrieta e dois especialistas do Serviço de Diagnóstico por Imagem do Hospital Universitário da USP, Claudio Castro e Antônio Matioli.

Com informações do Folhapress

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